Os estereótipos de gênero: reflexões sobre a erotização infantil

Por: Maria Eduarda V. dos Santos, Karolina da Silva Duarte e Roger Lucas de Sousa Nascimento

Estudantes do Curso Técnico de Eletrônica (IFPA, campus Belém) 

Os estereótipos de gênero estão profundamente arraigados em nossas vivências, a tal ponto que, muitas vezes, falhamos em reconhecê-los, juntamente com as adversidades que carregam. Expressões como "menina, sente-se direito" ou "ajeite esse vestido, sua calcinha está à mostra" e até mesmo comentários disfarçados de piadas ou elogios, como "essa garota vai ser um problema quando crescer" ou "ela tem um corpo maduro para a idade dela," compartilham uma característica em comum: a objetificação de corpos femininos e/ou infantis. Assim, observa-se que tais discursos estão profundamente arraigados de preconceitos, estereótipos e misoginia contra o feminino. Construções estas que surgem desde a infância, firmando-se ao longo da adolescência e vida adulta da mulher, demarcando papéis e servindo como estratificação para uma construção social de corpo feminino.

Em uma monografia intitulada "A influência da Indústria Cultural Brasileira na Sexualização Infantil e nos processos de infantilização da mulher adulta", Julia Silva ressalta que a indústria expõe crianças a produtos que deveriam ser voltados para adultos, como maquiagem infantil e até mesmo roupas com conotação sexual, decotadas e extremamente justas, ao mesmo tempo em que cria na mente da criança a falsa ideia de que ela pode se comportar como um adulto. Do forma similar, a indústria utiliza a imagem de mulheres com aparências associadas à infância, trajando roupas em cores vibrantes, enfeites infantis, como babados nas roupas, glitter, estampas coloridas, tranças no cabelo etc., enquanto vestem roupas extremamente curtas e realizam danças sexualizadas e provocativas.

Fonte: Balenciaga, 2022.

Sobre a presença desses estereótipos na indústria da moda, observa-se que a publicidade contribui para a perpetuação desse tipo de conteúdo, nos quais, tanto as mulheres são retratadas de forma infantilizada, como os corpos infantis são sexualizados. Um exemplo ilustrativo disso é a campanha "Gift Shop" da marca de luxo Balenciaga, lançada em 2022 com o propósito de promover sua mais recente coleção de acessórios e objetos para o lar, destinada às festividades de fim de ano.


Fonte: Balenciaga, 2022. 

Essa campanha provocou indignação devido à presença de fotos que mostravam crianças segurando bolsas em formato de ursinhos de pelúcia e usando acessórios que faziam referência às práticas BDSM (práticas consensuais envolvendo bondage e disciplina, dominação e submissão, sadomasoquismo e outros) – como colares, comumente chamados de choker, com cadeado, e anéis de couro.

Mais uma campanha publicitária que ilustra a sexualização de crianças por parte de marcas de roupas é a da Vogue, denominada "Sombra e Água Fresca". Nessa campanha, as crianças são retratadas em imagens altamente sexualizadas, vestindo apenas biquínis, com algumas delas insinuando a remoção de suas camisas ou adotando poses sugestivas, incluindo a abertura das pernas.


Fonte: Vogue Kids, edição nº 22, 2014.



Reflexos na sociedade brasileira


São expressivos os efeitos dessas propagandas na realidade brasileira. Conforme a senadora Leila Barros declarou em uma transmissão de televisão em rede aberta, o Brasil confirmou sua posição como o segundo país com o maior número de casos de exploração sexual de crianças e jovens.


Atualmente, diversas diretrizes e regulamentações estão em vigor para proteger a representação de crianças na mídia digital. Por exemplo, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, promover publicidade direcionada ao público infantil em qualquer meio de comunicação é classificado como uma prática abusiva e ilegal, datando de 1990. No entanto, apesar disso, algumas empresas deliberadamente mascaram essas insinuações de maneira que apenas um grupo restrito de pessoas possa compreendê-las. Geralmente, essas empresas pertencem a marcas de renome entre as elites e se destinam apenas a esse público específico, ou seja, são exclusivas para quem possui acesso a essas mensagens codificadas.


Aprofundando-nos na questão, podemos identificar no ambiente virtual que a sociedade tem, desde a infância, ensinado os homens a sexualizar mulheres, agravada pela tendência de infantilizá-las. Isso acontece devido à construção social e ideológica de que mulheres com uma aparência jovem e comportamento infantil são objeto de desejo sexual. Além disso, a legislação brasileira, de maneira indireta, perpetua essa mentalidade, como é visto na lei da "idade núbil", que autoriza o casamento de adolescentes a partir dos 16 anos com a devida autorização dos pais. É importante notar que a lei também permite atividade sexual a partir dos 14 anos, desde que haja consentimento. Esses elementos colaboram para alimentar a problemática da pedofilia, já que não apenas expõem e vulnerabilizam crianças e adolescentes, mas também endossam certos comportamentos dentro dos limites da lei, perpetuando assim estereótipos na mente da sociedade e normalizando situações que, de fato, constituem atos criminosos.


Hoje em dia, a abordagem ao combate à pedofilia frequentemente se concentra em lidar com o problema depois que ocorre, através da implementação de mais leis e medidas para reparar o dano causado a crianças e jovens, do que em métodos de prevenção. No entanto, é importante destacar que existem várias campanhas e projetos dedicados à prevenção.


Em 2022, a Câmara Municipal de Juiz de Fora, no Brasil, propôs um projeto que visa realizar campanhas publicitárias sobre o assunto nos transportes escolares, com o objetivo de transformar os veículos públicos e privados em um dos principais meios de disseminação da luta contra os crimes de pedofilia. Além disso, existem outras iniciativas, como a da senadora Teresa Leitão, que foi aprovada pela comissão de educação. O propósito desse projeto é capacitar profissionais da educação para identificar casos de violência e abuso sexual contra crianças e adolescentes, sendo denominado pela senadora como "olho clínico treinado".


Para finalizar, é crucial ressaltar a importância da luta contra a pedofilia nos dias de hoje. Trata-se de uma questão fundamental, uma vez que possibilita desconstruir estereótipos prejudiciais enraizados em nossa cultura. Para alcançar esse objetivo, é essencial que as pessoas questionem continuamente comportamentos ilegais que foram normalizados. Além disso, o papel do Estado é de suma importância na criação de leis e projetos que desestimulem práticas inconstitucionais.


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